9 de set. de 2015

O que andam falando do cordel... Tirana em BH

A Tirana integrou a Primeira Mostra in Minas de Teatro que reuniu 32 grupos do interior e da capital do estado de MG. O Coletivo INMINAS é um coletivo de grupos e artistas de teatro que vem se articulando com o objetivo de reunir forças e buscar espaços para os muitos grupos e artistas com trabalhos contínuos no cenário teatral de Minas Gerais. Segue a análise feita por Lucas Fabrício do espetáculo o Caboclo Zé Vigia

Retirado do link: 
https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=1474680049502643&id=1463076180663030&substory_index=0

TIRANA CIA DE TEATRO - Belo Horizonte
O Caboclo Zé Vigia
Análise de Espetáculo

Ao chegar no gramado do Parque Municipal, um grande círculo de objetos rodeado por cadeiras prenunciava que algo se passaria ali: a apresentação do espetáculo “O Caboclo Zé Vigia” da Tirana Companhia de Teatro, de Belo Horizonte, adaptação para teatro de rua do cordel homônimo de José da Costa Leite.

Na história, que se passa no sertão nordestino, dois caboclos de sangue quente disputam o amor de Salomé, a moça mais bonita da região. No desenlace da disputa, o diabo e um anjo, além do Chico Doido, irmão de Salomé, acompanham os acontecimentos contribuindo para novos arranjos e desarranjos. São todos personagens da cultura popular do sertão
brasileiro, além de figuras do imaginário religioso, que mostram a simplicidade dos que vivem no sertão.

Como grande parte das histórias de cordel, a trama se desenrola a partir de desencontros, armações e trapaças dos personagens, em que a ingenuidade de uns e a astúcia de outros interfere cada vez mais na situação inicial: neste caso, a disputa entre Zé Vigia e Zé do Cangaço pelo amor de Salomé.

A literatura de cordel, expressão literária típica no nordeste brasileiro e também presente em algumas regiões do interior de Minas Gerais, é uma narrativa em geral curta, escrita principalmente em sextilhas e rimada. Tem uma intensa relação com a oralidade, já que, inicialmente, os cordéis eram relatos orais, sendo posteriormente impressos em folhetos e pendurados em cordas, daí a origem do seu nome. Assim, tem como característica um ritmo melódico constante que imprime velocidade à narrativa, com saltos temporais e de espaço para acomodar os acontecimentos.

Na adaptação deste texto para o teatro, na linguagem da rua, a Tirana Cia. de Teatro constrói uma encenação fluída e engenhosa, em que atores e objetos se desdobram para dar vida à história e às rimas do cordel, criando um espetáculo com ritmo constante, quase coreográfico.

Os atores se alternam ora em narradores, ora em personagens, manipulam objetos, cantam e dançam, sempre em função da narrativa. O trunfo é dar imagem e corpo à oralidade do cordel. Para fazer emergir as situações da história, utilizam diálogos e narrações, mas também músicas e objetos que ganham função narrativa e muitas vezes bastam para criam os sentidos do texto.

Praticamente não há cenário fixo: uma lona no chão demarca o círculo, a “cena”, além dos objetos que são manipulados pelos atores, o que favorece a apresentação do espetáculo em diferentes espaços. É a caracterização dos personagens que permite a contextualização da história. Os figurinos, assinados por Fabíola Rosa, reproduzem os tons e cores do sertão nordestino e imprimem poesia ao espetáculo. Além disso, os atores mantem em suas falas o sotaque do nordeste, acentuado e figurativo, mas necessário para construção do espaço ficcional da história. Com a presença imperativa da música, cantada e tocada pelos atores, a cena se torna rima e poesia de cordel.

Apesar da simplicidade da história, que trata sobretudo de como o homem do sertão lida com questões grandiosas como o amor, o grupo aponta outros caminhos quando posiciona-se criticamente sobre alguns acontecimentos da narrativa, levantando questões políticas e demonstrando, assim, aprofundamento e contextualização do texto à realidade. Questionam, por exemplo, a banalização da violência e da criminalidade gerada pelos jornais populares de grande circulação e a imobilidade das pessoas perante a violência contra a mulher, este último em um dos momentos mais fortes e bonitos do espetáculo. Assim, mostram que a rua e o teatro popular podem (e devem) ser também lugar de debate e crítica.


A Tirana Cia. de Teatro demonstra domínio da linguagem da rua e constrói um espetáculo que contribui para a valorização da cultura popular e da literatura de cordel, contextualizados na contemporaneidade. Além disso, a “coletividade” da encenação, já que todos os atores executam diversas funções em cena, reflete sincronia entre o grupo. Nestes tempos em que produzir teatro em grupo é cada vez mais difícil, ver uma companhia de artistas dedicando-se à cultura popular e ao teatro de rua com competência é uma enorme alegria. Vida longa!

O que andam falando do Cordel...Tirana em Rondônia

E em baixo das Três Caixas d'água (Porto Velho-RO), o azougado do Zé do Cangaço pediu um copo de água fria a Salomé, mas o fogo no rabo do maldito foi apagado por um balde d'água dos céus, literalmente.

Veja o que falaram por lá de nosso trabalho de cá!



Retirado do blog http: //teatroderuaeacidade.blogspot.com.br/


Quem está na chuva é pra se molhar

Júnior Lopes[1]

Foi debaixo de uma tímida chuva que no dia 24 de junho de 2015 na Praça das Três Caixas d’água, que São Pedro e o público porto velhense receberam o grupo Tirana Cia de Teatro de Belo Horizonte. No entanto, a chuva não foi motivo para que o público se dispersasse. Durante o acolhimento dos espectadores, com direito a dança da chuva, foi se formando uma roda para a apresentação da peça O Caboclo Zé Vigia, no Amazônia Encena na Rua.

A Tirana Cia de Teatro nasceu no Teatro Universitário da UFMG em 2008 e de acordo com a Cia, desde a sua criação, o grupo tem como objetivo aproximar a cultura popular das artes cênicas, especificamente, o teatro de rua. Assim, apostam em um “teatro aberto” aproximando os espectadores para próximo de si e assim, investindo no contato direto e intenso com o público. Este objetivo fica claro desde a temática da peça, trazendo personagens da cultura popular do cordel, que de uma maneira poética e ao mesmo tempo cômica vai costurando temas polêmicos como traição, morte e crime passional.

Outro ponto de destaque diz respeito à disposição do público em roda, onde atores e atrizes estavam bem próximos, que sem uso de microfone, nem grandes estruturas de cenário, vão cativando o público, cada vez mais envolvido com a história.

Pipocas, algodão doce, pastéis e churros não conseguiram tirar a atenção da peça e muito menos a chuva intimidou o público, já que quem estava na rua acabou se molhando com a doçura e simplicidade do espetáculo.





[1] Professor do Curso Licenciatura em Teatro na Universidade Federal de Rondônia; doutorando na Universidade Federal da Bahia.